Anywhere Office: o futuro da colaboração


Está na hora de acordar. É o começo do quarto dia de caminhada na trilha de Torres Del Paine.  A sensação de estar frente a frente com um dos cenários naturais mais espetaculares do planeta enche você de energia para enfrentar mais um dia cheio. Antes de mais nada, é preciso preparar o café da manhã, checar se os painéis solares portáteis estão funcionando, se estão carregando as baterias, e se o seu celular está pronto para um novo dia de trabalho. Após comer e estar completamente desperto, você também checa o horário. Então o seu assistente virtual avisa que faltam apenas 15 minutos para a sua reunião de equipe. O primeiro passo para começar o expediente é colocar os óculos de realidade virtual e as luvas hápticas, as quais transmitem às mãos a sensação de tato para quando você está interagindo com o mundo digital. Num piscar de olhos, a vista deslumbrante do Valle del Francés é substituída por uma sala de reuniões com decoração minimalista e vista panorâmica para uma moderna metrópole. E essa era apenas uma entre as muitas opções disponíveis.


Enquanto espera pela chegada de cada colaborador, você se dedica primeiro à definição da aparência de um avatar que corresponda ao seu estilo – talvez seja uma boa oportunidade para estrear sua roupa e-Armani comprado na semana passada, e depois verifica suas anotações e as tarefas que foram realizadas no dia anterior. Logo em seguida, começam a aparecer os avatares dos membros da equipe. Vocês se cumprimentam com apertos de mão, e as luvas hápticas transmitem a sensação do toque de uma maneira quase indistinguível da experiência ao vivo. Alguns deles podem estar em outros países, em outros fusos horários – não há como saber. O que importa é a conexão entre todos, assim como o fato de que existe trabalho a ser feito.


A reunião transcorre de maneira rápida e eficiente. Problemas são resolvidos, documentos são compartilhados, tarefas são atribuídas e prazos são definidos. Seu assistente virtual – que desde o mês passado tem a aparência de uma bibliotecária de meia-idade, mas antes era uma cópia perfeita que incluía o famoso agasalho com gola rolê preta do fundador da Apple, o Steve Jobs – prepara uma ata da reunião que é distribuída a todos os participantes e atualiza as agendas automaticamente. Ao fim, todos(as) se despedem e, um a um, desaparecem da sala de reuniões.


Você decide trabalhar ainda por algumas horas antes de continuar sua caminhada. A dúvida agora é trabalhar dentro do seu escritório virtual, ou mudar os seus óculos para o modo Realidade Aumentada, usando a interface que tem como fundo a paisagem natural do vale. Durante todo o período da manhã, você foca nas tarefas a serem entregues, interage com seu time e resolve um sem-número de pendências. Agora é hora de desmontar o acampamento e seguir viagem, porque hoje à noite há mais uma sessão de trabalho antes de acabar o dia.


Bem-vindo ao mundo do Anywhere Office, o escritório que existe em qualquer lugar. Um lugar onde sua capacidade de colaborar e de gerar valor não está mais limitada a um espaço físico. Ele pode parecer distante, mas deve fazer parte dos seus dias muito antes do que você pensa.


A ascensão do trabalho remoto


Até há pouco tempo, trabalho remoto como modalidade abrangente e, muitas vezes, permanente, era percebido pela maioria das organizações como uma possibilidade ainda distante da realidade. Entretanto, estudos recentes da gigante internacional da área de espaços comerciais, a IWG (International Workplace Group), mostraram que, na verdade, cerca de 70% da força de trabalho global já atuava pelo menos uma vez por semana de forma remota, utilizando teleconferências e ferramentas de colaboração. E isso foi antes da pandemia.


Antes da crise, as formas de colaboração puramente remotas ainda eram vistas apenas como uma alternativa aos modelos tradicionais para casos específicos. Os freelancers, profissionais atuantes em mercados que não demandam a criação ou manutenção de uma estrutura física, ou o home office como uma parte da jornada de trabalho tradicional, onde o funcionário pode trabalhar um ou mais dias a partir de sua casa, são exemplos desses casos. O número de adeptos às plataformas de videoconferência já estava crescendo bastante antes da pandemia do Covid-19, graças ao acesso a conexões com internet cada vez mais rápida e robusta. Zoom, Google Hangouts Meet, MS Teams e Skype, entre outros exemplos mais populares, unem-se nesse universo a uma miríade de aplicativos de colaboração remota baseadas na nuvem, como Basecamp, G Suite, MS Suite, Trello, Miro, Slack, Tableau, Doodle e muitos outros.


Presos(as) indefinidamente em nossas casas  pelo isolamento social, corríamos o risco de ver a economia paralisar-se indefinidamente, os empregos desaparecerem e as empresas fecharem. Para garantir alguma sobrevivência, foi necessário sair da nossa zona de (des)conforto e reinventar, de maneira rápida e exponencial, formas de colaborar e gerar valor para as organizações, por meio da adoção quase majoritária do trabalho remoto como possibilidade primária de renda. De repente, o foco no trabalho remoto deixou de ser uma opção: virou uma questão de sobrevivência para muitas empresas. E esse é um caminho que não tem volta.


Nômades digitais, sejam bem-vindos!


O mundo emergente do Anywhere Office está transformando a realidade em algo que até pouco tempo poderia ser parte de um conto de ficção científica. No momento em que falamos, surgem iniciativas como a da empresa SpaceX, fundada pelo bilionário empreendedor Elon Musk, e que está colocando no espaço a rede Starlink com mais de 12 mil satélites. O empreendimento vai disponibilizar internet banda larga para todo o planeta, incluindo desta vez os cantos mais remotos. E essa é apenas uma das iniciativas ambiciosas que têm como objetivo democratizar o acesso à internet para todos os membros da nossa aldeia global. A Amazon também está investindo na mesma direção com o seu projeto Kuiper, lançando no espaço mais de 3.000 satélites, assim como a OneWeb e o Facebook também estão na corrida para conectar todos os cantos do mundo.


De repente, já não parece mais tão distante para você a ideia de ter o seu escritório em um veleiro conectado com o mundo e que viaje da Nova Zelândia para a Polinésia Francesa. A mudança com o modelo de trabalho remoto não transforma apenas a localização geográfica dos espaços de trabalho, mas sofrerão mudanças profundas também o ritmo de vida das pessoas e a estrutura urbana das grandes cidades. Sem a necessidade de morar perto da sede da empresa onde trabalha, ou de se deslocar até lá com frequência, uma boa parte dos profissionais vai poder escolher qual tipo de vida quer levar e onde quer viver. Isso vai criar uma oportunidade sem paralelo de transformar a maneira como centros urbanos se organizam, diminuindo a saturação de áreas centrais e causando um imenso impacto no mercado imobiliário.


Com a diminuição da necessidade de espaços comerciais, aluguéis e preços de imóveis serão reduzidos e, felizmente, o trânsito de todos os dias nos horários de pico praticamente desaparecerá. O enorme tempo antes gasto em deslocamentos cada vez mais lentos, em vias cada vez mais congestionadas, poderá ser dedicado à melhora da qualidade de vida, o que geralmente resulta em um período de maior produtividade. O ritmo das vidas pessoais e profissionais mudará e, desta forma, a busca pelos talentos que vão definir o futuro das empresas deixa de ser limitada pela geografia. O próximo colaborador pode estar baseado em Teresina, na Estônia, em Jakarta, numa pequena ilha em um arquipélago perdido no Pacífico, ou mesmo numa fazenda remota no meio das montanhas da Nova Zelândia. No mundo do Anywhere Office, nos tornamos cloud citizens, cidadãos da "nuvem", verdadeiros nômades digitais, não mais limitados pelo espaço físico ou temporal. E essa transformação é só o começo de uma longa jornada de mudanças.


Vivendo e colaborando na "nuvem”


Apesar de toda a capacidade oferecida pelas ferramentas de colaboração remota, elas ainda estão na pré-história de seu desenvolvimento. Sua adoção em massa durante o período da pandemia vai ter como uma das principais consequências a aceleração sem paralelos desse processo. Com o tempo elas vão se tornar cada vez mais eficientes, e o uso permanente de AIaaS (inteligência artificial como serviço, em português) para tarefas simples e repetitivas vai aumentar de maneira exponencial a nossa capacidade de produzir, assim como a qualidade dos resultados, criando a oportunidade de tornar o nosso trabalho cada vez mais criativo e qualificado.


Essas soluções baseadas na Inteligência Artificial também têm o potencial de reinventar a forma como interagimos remotamente com qualquer pessoa no planeta, graças a sistemas capazes de traduzir instantaneamente uma voz para qualquer idioma, como demonstrado recentemente por iniciativas como as da Microsoft Azure AI. O resultado previsto é a eliminação de barreiras culturais e o estímulo a uma colaboração cada vez mais abrangente e universal. Para acionar tal potencial, contamos com a chegada das redes 5G, as quais oferecem velocidades de transmissão de dados muito maiores, e o Cloud e o Edge computing, que aumentam exponencialmente o potencial de processamento remoto, uma vez que o processamento não ocorre dentro dos equipamentos eletrônicos, mas na nuvem dos computadores e celulares. 


O ritmo da mudança é tão rápido, que a Samsung anunciou recentemente que o desenvolvimento da rede 6G, o próximo estágio da revolução na transmissão de dados, está muito mais adiantado do que as previsões anteriores, e que sua distribuição vai acontecer dois anos antes do esperado, a partir de 2028. Segundo a empresa, essa nova tecnologia é tão poderosa que será capaz de criar experiências virtuais indistinguíveis das experiências físicas, criando possibilidades extraordinárias de conexão entre dois mundos que ainda existem separadamente. A combinação entre essas tecnologias faz com que a realidade virtual (VR), a realidade aumentada (AR) e a realidade mista (MR) se transformem em uma parte integrante do cotidiano do nosso trabalho. 


Realidade virtual como nunca se viu antes


Apesar da evolução extraordinária das tecnologias que já nos conectam, ainda estamos vivendo hoje os primórdios da colaboração remota. Apesar da enorme quantidade de opções disponíveis, apenas começamos o nosso caminho em direção a experiências de interação cada vez mais imersivas e realistas. A qualidade das interfaces das ferramentas de teleconferência e a experiência do usuário ainda tem um longo caminho a percorrer. Imagine quando as conexões forem capazes de oferecer um ganho exponencial na fluidez e na resolução das imagens… Com a adoção do edge computing e de outras tecnologias emergentes, as interações baseadas na realidade virtual e na realidade aumentada vão chegar cada vez mais indistinguíveis da experiência ao vivo - não necessariamente porque serão iguais ao que já conhecemos, mas porque serão tão complexas e ricas que vão criar uma ilusão da presença física absolutamente convincente.


O performance capture é uma tecnologia que deve ser incorporada às nossas interações virtuais através de avatares. Eles visam criar um tipo de efeito, o qual já é amplamente utilizado na indústria de cinema, no qual não só os movimentos, mas as expressões mais sutis da performance são capturadas e transferidas para versões digitalizadas, adicionando cada vez mais nuances à interação não-verbal com os interlocutores, o que torna as interações cada vez mais ricas e imersivas. Já existem iniciativas que incorporam essas inovações, como a HTC Vive Sync, que usa o eye-tracking (captura de movimento de olhos) e mouth-tracking tech (captura de movimento da boca) para criar simulações maravilhosamente fiéis aos usuários. Neste mesmo setor, temos o Facebook Codec que cria avatares ultra realistas ao copiar fielmente as expressões dos usuários, tornando-os quase perfeitos aos olhos da rede.


Tanto a aparência, como as expressões faciais, vozes e até mesmo a nossa intonação poderão ser “hackeadas” em prol de mais controle sobre como os nossos interlocutores vão nos perceber. Imagine o impacto que isso poderia ter durante uma apresentação virtual, em que o apresentador está nervoso, enquanto seu avatar consegue apresentar uma tranquilidade total, tanto na aparência quanto no tom de voz. Ou durante uma negociação, onde mais de uma pessoa poderia assumir o controle do avatar dependendo do assunto, sem que os demais interlocutores se dêem conta disso. A evolução conjunta de todas essas tecnologias, assim como o surgimento de outras que ainda não somos capazes de imaginar, vão adicionar cada vez mais nuances às nossas interações remotas, fazendo com que elas se tornem progressivamente mais ricas e complexas.


Isso não quer dizer que a interação remota vai substituir completamente as interações face a face, mas vai tornar cada vez mais relevante o nosso repertório de contatos humanos. Entretanto, tudo isso ainda é um trabalho em andamento, em constante mudança e que não tem hora para acabar. Sobre a riqueza da interação face a face, precisamos lembrar que pessoas já se apaixonaram por outras pessoas através de cartas enviadas pelo correio num passado não tão distante assim. No contexto atual, a tecnologia está adicionando outros elementos para dar cada vez mais profundidade às nossas interações remotas. Afinal, a maior parte das narrativas que vivemos acontece dentro das nossas cabeças.  


Essa é a era do Metaverso.


O Metaverso e a reinvenção da realidade


O termo Metaverso foi criado pelo escritor Neal Stephenson no livro Snow Crash em 19926. A história se passa em um futuro distópico, em que as pessoas passam a fazer parte da sua existência como “avatares” em um mundo simulado através de realidade virtual. Essa visão se tornou tão influente e aspiracional para líderes da indústria tecnologia, como os fundadores do Google Larry Page e Serguei Brin, e Jeff Bezos, da Amazon, que se tornou literatura obrigatória para as lideranças das companhias estão dão forma ao mundo digital.

Ele é um ambiente digital produzido por uma combinação de tecnologias, como a realidade virtual e a aumentada e híbrida, que cria uma experiência imersiva compartilhada, cocriada, perene, descentralizada e interoperável.

Mas o que significa isso?

É uma experiência sensorial interativa, criada a partir de ferramentas digitais capazes de transportar nossa percepção para uma realidade totalmente sintética, em 3D, ou para uma realidade física “aumentada” pela adição de elementos digitais, através do uso de instrumentos como óculos de realidade virtual ou de realidade aumentada ou mesmo através dos nossos celulares e computadores. Essa realidade é compartilhada com outras pessoas e não é ligada ou desligada – ela continua existindo e evoluindo, quer estejamos nele ou não.

Nós vivemos essas realidades através de avatares – representações digitais da nossa presença nestes mundos virtuais. Eles podem tomar as formas mais variadas, desde aqueles que parecem personagens de animações feitas para crianças, como os da plataforma de colaboração virtual Facebook Horizons Workrooms, até os ultrarrealistas, desenvolvidos por companhias como a Epic Games através da sua ferramenta Metahuman.

Nele você pode criar a sua própria identidade – e sua aparência pode mudar conforme a sua necessidade, a sua vontade e o lugar onde você está.

O Metaverso é criado e transformado de forma colaborativa pelas empresas e usuários que fazem parte dele e está sendo visualizado como um espaço descentralizado e democrático, assim como a internet – apesar de um bom número de companhias estarem tentando assegurar sua influência e alcance. É composto por múltiplos “mundos” que coexistem e são interconectados, permitindo aos usuários um movimento sem barreiras através das suas fronteiras virtuais.


Desenhando as Organizações do Futuro Através do Metaverso


Nos últimos tempos, o Metaverso tornou-se um dos assuntos mais discutidos pela sociedade. Esse bombardeamento incessante de informação, desinformação e muitos exageros acaba criando uma percepção distorcida a respeito do seu papel no futuro próximo e distante do nosso trabalho.
Mais do que tomar decisões a partir das enormes expectativas criadas a respeito das possibilidades extraordinárias que o futuro nos reserva, temos que deixar de ser reféns do FOMO (Fear Of Missing Out – o medo de perder algo importante que está acontecendo) e passar a tomar decisões informadas para que a integração do Metaverso no ambiente de trabalho seja motivada por necessidades das nossas organizações. Estas são as principais áreas que essas novas plataformas vão atuar:

  • Apoio à produtividade;

  • Aumento da eficiência;
  • Contratação de Talentos;
  • Satisfação no ambiente de trabalho;
  • Capacitação e treinamento da força de trabalho, construindo habilidades e competências;
  • Exploração de novos modelos de colaboração;
  • Diversidade, Igualdade e Inclusão; 

Já existem aplicações disponíveis para que os profissionais de Recursos Humanos (RH) e negócios possam explorar as inúmeras possibilidades que o Metaverso oferece para o desenho de experiências nas nossas organizações. Aqui estão algumas delas:

- Feiras de recrutamento virtuais: nelas candidatos podem interagir com seus potenciais empregadores, explorar os espaços de trabalho de forma virtual, acessar informação a respeito da organização e criar um retrato preciso do tipo de companhia que eles iriam trabalhar;

- Entrevistas e Avaliações Gamificadas: além de interagirem com os entrevistadores no ambiente, os candidatos também podem ser testados em simulações que representem situações de trabalho, onde suas competências serão postas à prova;

- Espaços de Colaboração Virtuais: ao contrário dos espaços físicos, limitados na sua forma, funcionalidade e aparência, os de colaboração do Metaverso podem ser totalmente adaptados às necessidades da atividade, do tamanho da equipe e do momento, além de oferecerem a integração com ferramentas de produtividade e colaboração, permitindo aos colaboradores compartilhar as suas ideias com os seus pares;

- Reuniões: de encontros individuais a interdepartamentais, os espaços virtuais podem ser adaptados e redesenhados de acordo com as necessidades do momento, fazendo com que as interações sejam mais imersivas e permitindo que os colaboradores fiquem focados na atividade;

- Eventos: de encontros interdepartamentais, passando por eventos corporativos, celebrações e chegando a convenções globais, o Metaverso pode criar a infraestrutura escalável para interativos e imersivos que podem incluir desde palestras interativas a shows virtuais;

- Treinamento e Educação – a utilização de ambientes de aprendizado de virtuais pode conectar os colaboradores com um espaço sempre disponível, onde é possível aprender através da interação com cenários da vida real, explorando inúmeras possibilidades, diminuindo o tempo necessário do treinamento e aumentando a retenção;

Essas soluções criam uma janela de oportunidade sem paralelo, que nos permite repensar a estrutura dos nossos negócios. Com elas, o mundo físico e o digital tornam-se cada vez mais indissociáveis, e as relações da força de trabalho com as organizações, mais complexa. Antigas ocupações se transformam, novas profissões surgem. Novas habilidades serão descobertas e outras terão que ser desenvolvidas. E tudo isso vai acontecer em um ritmo cada vez mais acelerado.

Neste processo corremos o risco de ver replicados e amplificados vieses, fontes de ineficiência, desigualdade, desgaste mental e estresse cada vez mais presentes nas organizações contemporâneas.

Muitas perguntas terão que ser feitas. Entre elas:

- Quem serão os donos da enorme quantidade de dados gerados sobre o nosso comportamento no Metaverso? Como eles serão utilizados pelas nossas organizações e pelo governo?;
- Como preservar a segurança dos dados e das identidades dos nossos colaboradores?;
- O que fazer quando problemas do mundo físico, como assédio ou preconceito, se reproduzirem no mundo digital?;
- O que fazer quando a aparência do avatar de um colaborador for diferente da sua aparência física?;
- Como gerir, recompensar e cuidar do bem-estar de uma força de trabalho fragmentada, em que alguns trabalham 100% no mundo físico, outros de forma híbrida e uma parte 100% no Metaverso?

Nesses novos contextos, o nosso maior desafio será preparar os gestores da linha de frente desse processo de transformação radical, para que possam focar cada vez mais em ser facilitadores de relações de trabalho e curadores do bem-estar dos seus colaboradores, adaptados a organizações existentes em um ambiente líquido, parte físico, parte digital, em constante mudança.

A chegada do Metaverso ao mundo corporativo marca o início era do Employee Experience como foco das organizações e do design centrado na experiência humana e como ferramenta principal de transformação organizacional.

Com essas mudanças no horizonte, corremos muitos riscos, mas as oportunidades são ainda maiores.


A ascensão dos cloud citizens – os cidadãos da “nuvem”


Em um mundo de crescente desmaterialização da colaboração, o espaço no qual colaboramos tomará formas híbridas, e o físico e o virtual se integrarão cada vez mais. Os resultados algumas vezes serão familiares, outras vezes totalmente disruptivos, inovadores e inéditos. E à medida que essa nova linguagem se desenvolve, novos espaços de trabalho se tornarão irreconhecíveis. 


Escritórios de arquitetura e design especializados em criar espaços de trabalho, salas de reunião virtuais e interfaces de colaboração desenhadas para maximizar nossa capacidade de produzir e interagir com nossos pares terão demandas cada vez maiores. Ter o espaço virtual da sua organização desenhado por arquitetos e designers  famosos será tão sexy como hoje acontece na realidade física. Revistas digitais farão matérias sobre os designs de espaço de trabalho em destaque, que vão inspirar novas gerações de projetos para os escritórios do mundo digital. 


Não são apenas as nossas interfaces de colaboração e os espaços de interação que vão tomar novas formas. As nossas versões virtuais – os avatares – também serão desenhadas e customizadas com um nível ainda maior de sofisticação, se tornando cada vez mais representativas de quem somos e da imagem que queremos projetar. Todas essas mudanças não serão limitadas aos espaços virtuais em que vamos aprender, trabalhar e colaborar. Nossas versões digitais também passarão por uma transformação.


Surgirão companhias especializadas na criação de avatares customizados com aparências físicas personalizadas e cada vez mais complexas. Designers de moda para avatares, assim como lojas de roupas e acessórios virtuais, novas grifes e marcas famosas do mundo físico também vão ocupar seu espaço no mundo digital. Tudo para tornar a nossa interação e a nossa presença virtual cada vez mais natural, profunda e imersiva.


Contudo, possibilidades ainda mais extraordinárias estão para surgir com a adoção dessas novas formas de interação. Como a aparência dos avatares não está necessariamente ligada à nossa aparência física, a adoção da interação baseada na realidade virtual pode marcar o início da libertação de convenções determinadas pelos estereótipos. Assim, a aparência física, o sexo, a orientação sexual e a idade passam a ter um outro sentido quando as pessoas têm a opção de escolher como são vistas pelo restante do mundo. 


Seria possível optar, por exemplo, por um avatar a aparência exata como a sua, ou outro com a de um executivo grisalho, de uma atriz de uma série de sucesso ou de um astro da música pop. Que tal o personagem do seu filme favorito, ou algo que veio direto da sua imaginação, ou do talento de um designer de avatares? As opções são ilimitadas. E mais do que isso: pessoas com limitações físicas que impossibilitam ou dificultam a integração no mercado de trabalho podem ver essas barreiras removidas, assim como o seu processo de inclusão facilitado.


Será possível ir ainda mais longe num futuro não muito distante para promover a inclusão cada vez mais na sociedade. A integração do cérebro com a “nuvem” vai possibilitar que pessoas com limitações ainda mais severas, como paralisia cerebral e escleroses múltiplas em estado avançado, se conectem com o universo digital e se libertem das barreiras físicas que as impedem de levar vidas plenas e produtivas. Tal conjectura pode soar quase como uma narrativa de ficção científica, mas já existem iniciativas como as das empresas Neuralink e Kernel, que demonstraram ser apenas uma questão de tempo para que esse avanço torne-se realidade. 


Ao longo do progresso, é fundamental o surgimento de oportunidades de inclusão e empoderamento como essas, que tenham o potencial de reinventar a forma como colaboramos, criando um sistema mais justo e com menos vieses, fundamentado na capacidade do indivíduo de gerar valor para sua organização e para a sociedade. Ainda assim, o futuro é mais complexo do que gostaríamos.


As muitas faces do futuro


Se, no mundo pré-pandemia, um futuro diverso, complexo e cheio de ambiguidades era visto como inevitável, a realidade que emerge do cenário extremamente caótico, complexo em que vivemos hoje produz ainda mais elementos disruptivos, muitas vezes antagonistas e contraditórios, onde o novo disputa espaço com o velho “normal”. O resultado é uma realidade emergente e híbrida. Um “Frankenstein”, onde partes que não combinam são forçadas a se tornar uma unidade, uma coexistência desconfortável, um eterno trabalho em progresso.

Pessoas, organizações e governos encontrarão soluções diferentes para os desafios que enfrentam. Seus resultados serão influenciados pelo mindset, pelo estágio de maturidade digital em que se encontram, pelos recursos disponíveis, por suas necessidades estratégicas, e pela pressão da busca pela prosperidade e sobrevivência. O mundo que emergir desse período de crise vai ser tudo menos homogêneo, porque, se as perguntas que precisamos responder para enfrentar nossos desafios são as mesmas do passado, as respostas podem assumir múltiplas formas, ou tons. Apenas uma coisa é garantida: seja qual for o futuro, a colaboração vai tomar formas totalmente novas.


Onde o mundo VUCA vai nos levar?


Nos encontramos em um momento de ruptura, e as crises têm o poder de acelerar o processo de transformação, de adoção de novas tecnologias e formas de trabalho. Algumas estimativas dizem que os próximos 20 anos vão trazer mais mudanças do que os últimos 300 anos da história da humanidade. As sementes dessas mudanças já estavam entre nós há algum tempo, mas o impacto disruptivo trazido pela pandemia, sem igual nas últimas gerações, fez com que tal ciclo fosse acelerado para uma velocidade irreconhecível. Agora as opções são transformar-se ou correr o risco de desaparecer.


Assim como todas as outras, essa transformação não é um processo linear. É tortuoso, doloroso, cheio de idas e vindas e resistência em maior ou menor grau. Um processo que acontece em velocidades diferentes para cada organização, indústria e país. Nessa jornada, as organizações deixam de ser definidas por prédios, andares, salas de reunião, escritórios, mesas, cadeiras, ou pela presença física de cada colaborador, e passam a ser definidas pela sua capacidade de se conectar com a sua força de trabalho, e de gerar valor.


O objetivo final é usar as tecnologias presentes e emergentes para nos libertar de nossas amarras físicas, e conectar os seres humanos de maneiras que antes pareciam possíveis apenas em narrativas de ficção. E elas não vão substituir a necessidade do contato físico entre as pessoas, vão criar novas oportunidades de exercitar nossa humanidade.


Essa é a realidade do Anywhere Office: dinâmico, descentralizado, flexível, perfeito para funcionar no mundo VUCA (Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo) em que vivemos. E quem sabe onde ela pode nos levar? Será que até uma trilha em Torres Del Paine?


Sobre o autor

Futurista, advisor, pesquisador e SciFi Experience designer. Guilherme Rangel é formado em Publicidade e Propaganda pela ECA/USP, trabalhando no Brasil e no exterior. Depois de mais de uma década no Oriente Médio, onde liderou equipes multinacionais, multidisciplinares, multiculturais e multiétnicas, voltou ao Brasil para se envolver no cenário local de inovação. Foi duas vezes palestrante no influente SXSW, festival de inovação, tecnologia, interatividade e cultura que acontece em Austin, USA e, em 2021 e 2022, foi escolhido pela Thinkers360 como umas das 50 vozes mais influentes no mundo na área de VR/AR (realidade virtual e aumentada). Atualmente desenvolve um projeto de visualização de tendências do futuro, ajudando pessoas e organizações a se prepararem para um mundo em constante mudança.


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